- Mike, vamos para a praia?
- Mas já estamos nela.
- Não, quero dizer, vamos para o mar?
- Num tô a fim.
- Então me ajuda a buscar água para acabarmos de fazer o nosso castelo de areia?
- Tá.
Michael, ou Mike, levou a sua regadeira laranja. Mas não era uma regadeira cheia de buracos pequenas na ponta como a que a mãe usava para regar todas as samambaias do apartamento. Ela só tinha um pequeno buraco no fim do pescoço, como se fosse uma chaleira. Mas não era igual a da mãe. Esta era de plástico, não ia para o fogão e era o único que mexia nela.
No alto de seus 7 anos, Mike, então, encheu a regadeira até não suportar direito o volume em seus pequenos braços. Ele não ligava em carregar todo aquele peso. Sabia que boa parte daquela água salgada iria ficar no caminho. Mike gostava e fazia questão mesmo de deixar a sua marca no caminho. O garoto sonhava que um dia iria conseguir deixar uma pista para ser seguido.
Mike, porém, nunca viu ninguém seguir o rastro na praia. Nunca viu sequer uma pegada antes do mar levar embora todos os grãos de areia. Mas Mike nunca culpou o mar. Ele nunca culpou a mãe que havia largado o pai, nem a irmã. Ele culpava a si. Tinha algo de errado nele.
Vinte anos se passaram, e o pequeno Mike virou um homem. Já com uma barba no rosto, cabelo comprido e a novidade: um brinco na orelha esquerda. Uma combinação perfeita para deixar a mãe furiosa. Mas a fúria dela não durou muito.
No início, achou que fosse frescura, mas ao ver que Michael não saía mais de casa para beber com os amigos ou muito menos para comprar pão, ela ficou desesperada. Buscou ajuda da dona da farmácia, do porteiro, do zelador, da namorada, do médico até chegar a uma psicóloga indicada por uma vizinha.
- O que o seu filho tem é síndrome do pânico.
- O quê? O meu filho? Impossível?
- Mas é minha senhora. E continuou: O seu filho contou que toda vez que anda na rua acha que as pessoas estão sempre atrapalhando o caminho dele, sempre acha que tudo gira contra ele, que está sendo seguido. Mais do que isto, que está sendo perseguido, que tem toda a atenção do mundo para ele, apesar dele não ver o porquê. Até porque não existe um porquê. Ele acha que tudo gira contra ele. O Michael não consegue mais sair de casa porque tem medo das pessoas, teme que esteja sendo seguido.
Segurando um pequeno copo cheio de água de plástico branco na mão, Michael acompanhou cada palavra da psicóloga, mas não deu muita bola. O que ele pensava em silêncio era em saber como poderia deixar um rastro no chão do consultório sem que sumisse como na areia ou que não acabasse no castelinho de areia.
- Mas já estamos nela.
- Não, quero dizer, vamos para o mar?
- Num tô a fim.
- Então me ajuda a buscar água para acabarmos de fazer o nosso castelo de areia?
- Tá.
Michael, ou Mike, levou a sua regadeira laranja. Mas não era uma regadeira cheia de buracos pequenas na ponta como a que a mãe usava para regar todas as samambaias do apartamento. Ela só tinha um pequeno buraco no fim do pescoço, como se fosse uma chaleira. Mas não era igual a da mãe. Esta era de plástico, não ia para o fogão e era o único que mexia nela.
No alto de seus 7 anos, Mike, então, encheu a regadeira até não suportar direito o volume em seus pequenos braços. Ele não ligava em carregar todo aquele peso. Sabia que boa parte daquela água salgada iria ficar no caminho. Mike gostava e fazia questão mesmo de deixar a sua marca no caminho. O garoto sonhava que um dia iria conseguir deixar uma pista para ser seguido.
Mike, porém, nunca viu ninguém seguir o rastro na praia. Nunca viu sequer uma pegada antes do mar levar embora todos os grãos de areia. Mas Mike nunca culpou o mar. Ele nunca culpou a mãe que havia largado o pai, nem a irmã. Ele culpava a si. Tinha algo de errado nele.
Vinte anos se passaram, e o pequeno Mike virou um homem. Já com uma barba no rosto, cabelo comprido e a novidade: um brinco na orelha esquerda. Uma combinação perfeita para deixar a mãe furiosa. Mas a fúria dela não durou muito.
No início, achou que fosse frescura, mas ao ver que Michael não saía mais de casa para beber com os amigos ou muito menos para comprar pão, ela ficou desesperada. Buscou ajuda da dona da farmácia, do porteiro, do zelador, da namorada, do médico até chegar a uma psicóloga indicada por uma vizinha.
- O que o seu filho tem é síndrome do pânico.
- O quê? O meu filho? Impossível?
- Mas é minha senhora. E continuou: O seu filho contou que toda vez que anda na rua acha que as pessoas estão sempre atrapalhando o caminho dele, sempre acha que tudo gira contra ele, que está sendo seguido. Mais do que isto, que está sendo perseguido, que tem toda a atenção do mundo para ele, apesar dele não ver o porquê. Até porque não existe um porquê. Ele acha que tudo gira contra ele. O Michael não consegue mais sair de casa porque tem medo das pessoas, teme que esteja sendo seguido.
Segurando um pequeno copo cheio de água de plástico branco na mão, Michael acompanhou cada palavra da psicóloga, mas não deu muita bola. O que ele pensava em silêncio era em saber como poderia deixar um rastro no chão do consultório sem que sumisse como na areia ou que não acabasse no castelinho de areia.
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