A verdade está lá fora

Sabe qual é a diferença entre o casamento e o bar mitzvá?
A pergunta tem algumas respostas óbvias, mas a pessoa que perguntava não parecia esperar pelo óbvio, aquele jovem de 13 anos sabia que a resposta teria que ter algo de inteligente.
Esperando do lado de fora da sinagoga, Beni só tentava controlar de alguma forma o nervosismo daquele dia. Ele sabia que não tinha estudado tudo o que deveria, mas no fundo sabia o que deveria ser feito e o que faria em alguns instantes. Mas havia coisas incontroláveis, que não dependiam dele. Como a sua mãe iria reagir durante a cerimônia, se ela daria bronca por algum erro dele na reza, se o pai, que agora vivia um outro casamento, iria aparecer de surpresa, se os convidados iriam assistir àquela cerimônia, que não seria acompanhada de festa. Até Beni, no auge de seus 13 anos, sabia que sem comidinha e bebidas, o número de convidados cairia vertiginosamente.
De calça social, uma gravata que o enforcava e que a mãe o proibiu de tocá-la, terno e camisa de gola que incomodava todo o pescoço e parecia que ia até a orelha. Assim, muito nada à vontade Beni contava os minutos para cerimônia. Depois disso, o que vai mudar na minha vida, o que será de diferente? Será que poderia decidir, enfim, quando e como iria cortar o cabelo? Sim, porque aquele era outro problema para ele. Beni queria ter cortado antes, mas não foi ao cabeleireiro na semana que antecedeu o bar mitzvá. Teria que pedir dinheiro para a mãe, que iria questioná-lo até o último fio do porquê que ele fez aquele corte, que ele estava lindo antes, que estragou tudo e blablablablabla.... Melhor manter o cabelo grande, definitivamente, pensou. Mas apesar de estar resolvido com essa questão, o nervosismo era iminente.
Seus irmãos iriam tirar sarro por conta da vozinha que iria soltar na hora da reza? A amiga da mãe iria deixar a marca de batom terrível na bochecha antes ou depois da cerimônia? Os presentes que ganharia seriam aqueles que sempre sonhou? Quando vou poder tirar essa gravata, essa camisa e esse sapato?
Mas o pensamento acabou se esvaindo. Agora tinha uma pergunta pela frente.
Sabe qual é a diferença entre o casamento e o bar mitzvá?, perguntou aquele senhor com um terno já batido, mas alinhado. Calça azul marinho, camisa branca, gravata azul caindo para o lado esquerdo da barriga daquele senhor de seus 60 anos. Cabelo grisalho, e provavelmente a pessoa que mais havia estado em bar mitzvás e casamentos de todo aquele templo situado bem praticamente na rua da Consolação. Com um sorriso largo no meio do rosto arredondado, o porteiro esperou por uma resposta.
No meio do turbilhão de pensamentos, Beni fez um não com a cabeça e um sorriso amarelo.
Bar mitzvá é o único que só se faz uma vez. Então, relaxa e aproveita.
E Beni percebeu que a felicidade daquele momento não estava no altar, não estava dentro da sinagoga e muito menos com o possível não-erro no momento da reza. Vinte anos depois daquela pergunta, completou seu quinto ano de casado e percebeu que há muita vida também do lado de fora da sinagoga. E que os porteiros são uma boa fonte de inspiração.

Comentários

Rodrigo disse…
Adorei esse menino aí, o tal Bani, quero dizer, o Deni, ops, o Beni. :-)
Pois é, a inspiração pode estar onde a gente menos espera.
o_argentino disse…
Beni Blecpauer é o nome dele... bom sujeito...mas falhou em um quesito: cadê a foto do evento? duvido que não exista uma... adicione ao post
FAFÁ disse…
hahaha tô pagando pra ver esta foto, quem a tiver a gente negocia. Em tempo: muito bom o texto e para variar analogias ótimas
Camila disse…
nada como ficção de vida real
Anónimo disse…
Daninho,
Adorei o título e concordo plenamente com ele !!
Bjs