Bolsa

Indignado, Adelmir saiu de casa batendo a porta. Não conseguia entender como a mulher gastava o dinheiro tão facilmente. O país em crise, o mundo em crise, e ela só pensando no próprio umbigo. “Porra, mas será possível que ela acha que dinheiro é papel higiênico? E ainda aqueles cor de rosa?”, se perguntava, enquanto batia novamente a porta, agora do carro 1.0, com oito prestações a pagar.

No caminho para algum lugar, qualquer que fosse, longe do apartamento lugado, longe da esposa, o celular tocou. Era ela. “Porra, e ainda ela liga do telefone de casa. Quantas vezes eu já falei para ela que se ligar do celular o custo é quase zero?”, pensou. E Adelmir não atendeu. No caminho, o pai liga. De celular para celular, ele atende.

“Filho, não faz assim. Ela acabou de me ligar preocupada com você. Pediu para que eu ligasse e acalmasse você. Ela parece que está arrependida e...”

“Parece, pai, só parece. Foi a milésima vez que ela fez isso. Eu não entendo. Acho que é para me provocar, só pode. Ela já tem 815 bolsas e agora apareceu com mais uma... Sabe o que ela falou? Mas esse tom de vermelho eu não tinha, e ainda estava em promoção... Sabe o que significa promoção, pai? Que antes custava 900 paus e agora estava só 650! Seiscentos e cinquenta!”, respondeu dirigindo no meio da Marginal Pinheiros.

“Eu sei, meu filho. Elas são assim mesmo. São difíceis de entender. Eu mesmo nunca te falei muita coisa sobre a sua mãe, porque eu nunca soube captar o que ela dizia quando fazia esse tipo de coisa. Cheguei a ficar uma semana longe de casa, ainda antes de você nascer, ela prometeu que iria melhorar também. Bom, o resultado final você já sabe, né?”.

O resultado final foi o divórcio nada amigável entre os dois, que custou a ausência do pai, custou trocar o bom apartamento em que vivia com ambos nos Jardins pelo apartamento da avó materna, onde se economizava até no uso do papel higiênico. “Precisa usar mais do que dois pedaços por vez para se limpar?”, era um dos resmungos da avó que valeu dois dos oito anos de terapia.

“Conheço bem a história, pai”, disse Adelmir.

“Então você já sabe o que fazer, não, Júnior? Ou vai imitar os erros do seu pai e demorar para tomar uma atitude?”

A pergunta fez Adelmir ter uma ideia. De sem rumo, partiu para o shopping center mais próximo. Sabia exatamente o que fazer para não repetir o pai e dar um rumo diferente para a sua vida, para o seu casamento que tanto prezava. Ele queria tudo, menos passar novamente pela situação da infância. Ia dar um basta, ou ao menos, tentar dar um fim naquele sofrimento.

Voltou para casa, abriu a porta e encontrou a mulher comendo pipoca e vendo um filme dublado em algum canal a cabo qualquer. Ela não soube reagir à entrada dele. Desprevenida, deixou que ele desse a primeira ação. Com os braços para trás, Adelmir fez um gesto de surpresa e entregou o pacote para a mulher.

“Se você pode fazer o que bem entende, eu também posso. Agora, vamos ficar quites”, disse ele. Maria da Graça não entendeu, mas percebeu que ela é quem tinha que abrir o pacote.

Desfez o nó, arrancou o papel de presente e se espantou com o que viu. “Uma bolsa, querido? Mas... mas...” A frase não foi terminada. Ela contou com a sorte e com beijou asfixiante que recebeu. Adelmir arrancou a blusa dela, tirou a sua calça e ainda de meia, resolveram a situação ali mesmo no sofá. Ao final, se levantou e foi para o banheiro deixando a mulher sem fôlego estatelada na imensidão verde do sofá.

“A imprevisibilidade é a melhor forma de manter um casamento, sem falar é claro do pagamento em dez vezes sem juros”

Comentários

FAFÁ disse…
a vida em parcelas! e viva o cartão de crédito
Daf disse…
Qq semelhança com a vida real é mera coincidencia! Bjs, Fo
o_argentino disse…
Tu ainda vai virar o Veríssimo. Boa!